10/06/2025

Conferência internacional na FGV EMAp realça Brasil como protagonista mundial no setor de energia

Realizado pela primeira vez fora da Noruega, o Hydroscheduling comprovou a influência brasileira no cenário internacional em inovação e ciência aplicada ao segmento elétrico.

8ª Conferência Internacional sobre Planejamento e Despacho de Usinas Hidrelétricas foi sediada na FGV EMAp, no Rio de Janeiro | Foto: Divulgação/FGV EMAp

8ª Conferência Internacional sobre Planejamento e Despacho de Usinas Hidrelétricas foi sediada na FGV EMAp, no Rio de Janeiro | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Por meio da Escola de Matemática Aplicada da Fundação Getulio Vargas (FGV EMAp), o Brasil foi o primeiro país a sediar, fora da Noruega, o Hydroscheduling - a Conferência Internacional sobre Planejamento e Despacho de Usinas Hidrelétricas. Criado no país nórdico, o evento teve em sua 8ª edição um marco simbólico: sair de um protagonista europeu em produção energética para aportar em solo brasileiro, o segundo maior produtor de energia hidrelétrica do mundo.

Mais do que um gesto simbólico, a escolha do Brasil representa o reconhecimento de sua capacidade técnica, científica e operacional no planejamento energético, especialmente em um momento em que o mundo busca equilibrar eficiência, sustentabilidade e segurança energética. Segundo a Agência Internacional de Energia (IEA) e a Associação Internacional de Hidroeletricidade (IHA), o Brasil deverá responder por até 10% da produção mundial de energia hidráulica nos próximos anos — protagonismo que exige soluções cada vez mais inteligentes e integradas entre academia, setor privado e governo.

Conferência reuniu pesquisadores, estudantes e representantes da indústria energética do Brasil e do exterior | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Conferência reuniu pesquisadores, estudantes e representantes da indústria energética do Brasil e do exterior | Foto: Divulgação/FGV EMAp

FGV EMAp no centro do debate elétrico mundial

O palco da conferência foi a FGV EMAp, no Rio de Janeiro, entre os últimos dias 27 e 29 de maio, reunindo especialistas, pesquisadores, estudantes e representantes da indústria energética do Brasil e do exterior. Mais do que um centro acadêmico, a Escola tem sido protagonista no desenvolvimento de modelos matemáticos, algoritmos de otimização e técnicas de aprendizado de máquina aplicadas diretamente à operação do sistema elétrico brasileiro.

“Há matemática em todos os lugares do processo de geração de energia hidrelétrica”, afirmou Bernardo Costa, um dos responsáveis por trazer a conferência ao Brasil. “Desde modelos estatísticos para prever cenários climáticos e hídricos até algoritmos de otimização que equilibram custo, segurança e restrições ambientais, tudo depende de uma modelagem muito sofisticada. E é isso que estamos fazendo aqui, em parceria com os principais centros de pesquisa do mundo”, completou ele, que já realizou diversos projetos de aplicação ao setor energético brasileiro.

Pesquisador da FGV EMAp, Bernardo Costa exaltou a liderança da Escola para trazer o Hydroscheduling pela 1ª vez ao Brasil | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Pesquisador da FGV EMAp, Bernardo Costa exaltou a liderança da Escola para trazer o Hydroscheduling pela 1ª vez ao Brasil | Foto: Divulgação/FGV EMAp

O diferencial da conferência foi justamente sua capacidade de reunir, no mesmo espaço, pesquisadores, operadores do sistema, desenvolvedores de software, estudantes e empresas privadas, promovendo um diálogo profundo entre teoria e prática. Participaram representantes de países como Noruega, Suécia, Alemanha, França, Espanha, Chile, Islândia, Canadá e, é claro, do Brasil.

Segundo Bernardo, essa conquista é um marco para o Brasil e para a instituição carioca. “A primeira vez fora da Noruega é no Brasil, e isso mostra a força da nossa comunidade científica e a importância da geração hidráulica no país. A Escola tem grupos consolidados em modelagem estatística, otimização e machine learning. Foi um marco importante para a FGV EMAp liderar esse processo”, destacou o pesquisador da Escola.

O papel dos modelos no mercado de energia

Na atualidade, o setor elétrico brasileiro se organiza em duas frentes complementares: a operação física, coordenada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico Sistema Operacional (ONS), e a operação financeira, liderada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).

João Marcelo Mendonça aprovou o intercâmbio de conhecimento entre profissionais do ONS e pesquisadores acadêmicos | Foto: Divulgação/FGV EMAp

João Marcelo Mendonça aprovou o intercâmbio de conhecimento entre profissionais do ONS e pesquisadores acadêmicos | Foto: Divulgação/FGV EMAp

João Marcelo Mendonça, especialista em estudos elétricos do ONS, enfatizou o valor da interação com os estudos acadêmicos, pois cria oportunidades para que os processos internos sejam implementados através das pesquisas para que a energia produzida, transmitida e distribuída no país seja mais eficiente e segura para os consumidores. Além disso, o intercâmbio com especialistas de outros países também traz benefícios ao órgão.

“A operação de sistemas elétricos é um desafio global. Muitos problemas que enfrentamos aqui podem ser os mesmos em outros países. Ao compartilhar experiências, aprendemos com os erros e acertos dos outros, o que nos permite ganhar tempo, evitar retrabalho e entregar mais confiabilidade ao sistema elétrico brasileiro”, analisou Mendonça.

Engenheiro de modelos e metodologias energéticas no ONS, Lucas de Souza corroborou a visão do seu colega no monitoramento e controle da geração e transmissão de energia elétrica em tempo real no Brasil. “Trabalhamos com um dos sistemas elétricos mais complexos do mundo. A extensão continental do Brasil e o papel dominante da hidroeletricidade exigem modelos matemáticos robustos. Por isso, estar próximo da academia é essencial para tornar nossas decisões mais seguras e eficientes.”

Evento na FGV EMAp atraiu público do Brasil, Noruega, Suécia, Alemanha, França, Espanha, Chile, Islândia e Canadá | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Evento na FGV EMAp atraiu público do Brasil, Noruega, Suécia, Alemanha, França, Espanha, Chile, Islândia e Canadá | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Em um sistema tão intricado como o brasileiro, onde a geração de energia depende fortemente de fatores climáticos e hidrológicos, a previsibilidade se torna um ativo valioso. A operação física da rede é apenas uma parte do desafio — o outro lado, igualmente vital, é garantir que o mercado funcione com transparência, equilíbrio e previsões bem fundamentadas. É nesse ponto que o elo entre academia e mercado se mostra indispensável. Para Guilherme Matiussi Ramalho, gerente de modelos e estudos energéticos da CCEE, manter esse diálogo com os centros de pesquisa é fundamental.

“A definição do preço da energia é baseada em modelos matemáticos complexos. Precisamos prever, por exemplo, quanto vai chover, quanto vento ou sol teremos, e como isso afeta a oferta de energia. O trabalho da academia nos ajuda a refinar essas previsões com técnicas mais modernas, como machine learning. Assim, garantimos um mercado mais transparente e eficiente”, opina o profissional.

Lilian Chaves Brandão, pesquisadora do Cepel, foi uma das organizadoras do evento | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Lilian Chaves Brandão, pesquisadora do Cepel, foi uma das organizadoras do evento | Foto: Divulgação/FGV EMAp

A utilidade da pesquisa nacional

O Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel) teve presença expressiva nas apresentações técnicas e nas visitas institucionais ao seu laboratório e ao ONS. Lilian Chaves Brandão lembra que inovação também é uma constante. “Nossos modelos precisam acompanhar as mudanças no setor. Discutir com países que enfrentam desafios semelhantes ajuda a criar soluções mais eficazes. A hidroeletricidade brasileira é muito específica, como a da Noruega, e essa troca é enriquecedora”, analisa a pesquisadora.

Gerente do Departamento de Sistemas Eletroenergéticos do Cepel, André Diniz foi um dos idealizadores da vinda da conferência ao Brasil e celebrou a visibilidade inédita para a pesquisa nacional. 

“Desde 2008 participo do Hydroscheduling e ficava surpreso com a falta de presença de pesquisadores brasileiros. Mas não é fácil ir a um evento de apenas dois dias na Noruega, onde o custo é alto, é compreensível. Por isso, a realização no Brasil é um divisor de águas. Agora, nossos pesquisadores terão mais acesso a esse fórum internacional, e nossa produção científica terá mais reconhecimento global”, crê o pesquisador.

Para André Diniz, pesquisador do Cepel, conferência na FGV EMAp será um divisor de águas para o Brasil assumir protagonismo no tema energético | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Para André Diniz, pesquisador do Cepel, conferência na FGV EMAp será um divisor de águas para o Brasil assumir protagonismo no tema energético | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Empresas brasileiras também têm apostado fortemente em inovação. A Norus, com sede em Florianópolis, é um exemplo de como a tecnologia pode reduzir custos e beneficiar toda a sociedade. “O que fazemos é ajudar empresas a tomar as melhores decisões de compra e venda de energia”, explica Vitor de Matos, CEO da empresa de tecnologia e engenharia.

“Ao usar tecnologia para otimizar essas escolhas, ajudamos o mercado a ser mais competitivo e eficiente. E isso, no fim das contas, se traduz em uma conta de luz mais justa para o consumidor. Essa conexão entre academia e mercado é fundamental para esse ciclo virtuoso”, continua o empresário.

Pesquisadores internacionais: aprendendo com o Brasil

Essa ponte entre a academia e o mercado se estende também além dos continentes, como mostra a parceria entre a Norus e o pesquisador Andy Philpott, da Universidade de Auckland, na Nova Zelândia. A própria participação de Philpott na conferência foi viabilizada com o apoio da empresa catarinense — um exemplo concreto de como a colaboração entre indústria e universidade fortalece ambos os lados.

Andy Philpott, pesquisador da Universidade de Auckland, elegeu mercado elétrico brasileiro similar ao da Nova Zelândia | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Andy Philpott, pesquisador da Universidade de Auckland, elegeu mercado elétrico brasileiro similar ao da Nova Zelândia | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Para o pesquisador neozelandês, que pesquisa modelos para mercados de eletricidade interconectados, o Brasil oferece um laboratório vivo e estratégico. “Estou aqui para aprender sobre o mercado elétrico brasileiro, que é muito semelhante ao da Nova Zelândia em termos de hidroeletricidade, mas com desafios diferentes. É fundamental que a academia se envolva com problemas práticos — e, para isso, o apoio da indústria é essencial”, aponta Philpott.

A visão do pesquisador de Auckland sobre a importância de integrar a ciência com a prática operacional ecoou também entre os profissionais da indústria elétrica presentes na conferência. Um deles foi Martin Haaberg, responsável pelo planejamento da operação da HKV AS, hidrelétrica norueguesa responsável por cerca de 1% da eletricidade gerada no país nórdico.

Se, por um lado, os modelos matemáticos que norteiam os dois países — Brasil e Noruega — compartilham fundamentos semelhantes, por outro, os contextos hidrológicos, climáticos e geográficos impõem desafios bastante distintos.

Martin Haaberg é responsável pelo planejamento da operação da hidrelétrica HKV AS, na Noruega, e aprovou a experiência do Hydroscheduling no Brasil | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Martin Haaberg é responsável pelo planejamento da operação da hidrelétrica HKV AS, na Noruega, e aprovou a experiência do Hydroscheduling no Brasil | Foto: Divulgação/FGV EMAp

“Os modelos que usamos são, em muitos aspectos, parecidos com os aplicados no Brasil. Mas quando olhamos para os rios, os sistemas hidrelétricos e a própria configuração das usinas, percebemos que tudo muda — e muda por causa da natureza dos nossos países. Isso impacta diretamente como lidamos com operação, risco e planejamento”, explica Haaberg.

Assim como Philpott destacou a relevância de sair da teoria para entender as realidades do mercado, Haaberg ressaltou a riqueza de trocar experiências com países que enfrentam realidades operacionais tão diversas, mas que compartilham os mesmos objetivos: eficiência, segurança e sustentabilidade.

“É um grande privilégio estar aqui. Às vezes, ficamos presos às nossas próprias ideias. É essencial ouvir outras perspectivas, entender o que os outros estão estudando e como estão resolvendo problemas parecidos com os nossos”, completa o especialista noruguês em planejamento de produção energética.

Formação de novos talentos

Além de atrair especialistas veteranos da indústria e da pesquisa internacional, o Hydroscheduling 2025 deu protagonismo à nova geração de talentos que está sendo formada no Brasil — como os alunos da própria FGV EMAp. Para esses jovens, participar de uma conferência com tamanha densidade técnica e relevância global é mais do que uma oportunidade acadêmica: é a prova concreta de que os modelos, equações e teorias aprendidos em sala de aula têm impacto direto na sociedade.

Hydroscheduling 2025 atraiu operadores do sistema, desenvolvedores de software, estudantes e empresas privadas do setor elétrico | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Hydroscheduling 2025 atraiu operadores do sistema, desenvolvedores de software, estudantes e empresas privadas do setor elétrico | Foto: Divulgação/FGV EMAp

Foi o que percebeu Luís Henrique Bueno, estudante de graduação em Matemática Aplicada na Escola. “O que estudo na FGV EMAp é otimização estocástica, ou seja, a gente quer tomar uma decisão ótima com algo que é incerto no futuro, e isso é exatamente o que o setor precisa — decidir hoje como gerar energia sem saber se vai chover ou se o preço do carvão vai subir amanhã. Quando vejo que isso afeta o quanto as pessoas vão pagar na conta de luz, percebo que o que estudo na graduação é útil de verdade”, relata. 

Legado e futuro

A presença inédita do Hydroscheduling no Brasil marca um divisor de águas não apenas na história da conferência, mas também na posição do país dentro do cenário global da energia. Mais do que uma potência hídrica, o Brasil se mostrou uma potência científica e tecnológica, capaz de formular, aplicar e compartilhar soluções de ponta para os desafios complexos da matriz elétrica contemporânea.

Após Brasil receber a conferência em maio, Hydroscheduling está previsto no Canadá para a 9ª edição | Foto: Cris Vicente

Após Brasil receber a conferência em maio, Hydroscheduling está previsto no Canadá para a 9ª edição | Foto: Cris Vicente

O protagonismo brasileiro ficou evidente não só pela infraestrutura e excelência acadêmica da FGV EMAp, que liderou a organização do evento, mas também pela qualidade dos trabalhos apresentados, pela articulação entre instituições públicas, privadas e centros de pesquisa, e pela capacidade de diálogo técnico com os principais especialistas do mundo.

A próxima edição do Hydroscheduling, já confirmada para o Canadá, acontecerá em outro polo importante da hidroeletricidade mundial. Mais uma vez, o Brasil estará presente e se posicionando como um protagonista legítimo — com voz ativa, contribuição relevante e um ecossistema de inovação pronto para liderar. O futuro da geração hidráulica está sendo redesenhado — e o Brasil, definitivamente, está entre os países que estão escrevendo esse novo capítulo.

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